Uma das idealizadoras da instituição, epidemiologista Rosemary Pinto foi diagnosticada com Covid-19 no início de janeiro e não resistiu.
Uma mulher que defendia com paixão aquilo que acreditava, forte e de bom coração: foi assim que o esposo e as duas filhas descreveram Rosemary Pinto, de 61 anos, que morreu com Covid-19, há um mês. Ela é uma das mais de 10 mil pessoas que morreram com a doença em todo o Amazonas.
Uma das idealizadoras da Fundação de Vigilância em Saúde (FVS-AM), na qual ocupava o cargo de diretora-presidente, Rosemary Pinto foi a primeira e única mulher a comandar o órgão. Ela estava na linha de frente no combate à doença desde o início da pandemia. Foi diagnosticada com Covid no dia 5 de janeiro, iniciou tratamento domiciliar, mas necessitou de internação hospitalar no dia 11 de janeiro. Não resistiu e morreu em 22 de janeiro.
Com um misto de saudade e admiração, a família contou ao G1 momentos marcantes da vida e da carreira da epidemiologista. O administrador de empresas e marido de Rosemary, João Marcos Pinto, de 66 anos, com quem ela teve três filhos e estava casada há mais de 40 anos, disse que a relação com a família era de muita proximidade e de muito amor.
“Sempre fomos muito amigos um do outro. Compartilhávamos dos mesmos gostos musicais. Ela gostava muito de viajar e de estar na companhia da família”, lamentou.
Ainda segundo ele, descrever a esposa, a mulher com quem dividiu 47 anos de sua vida não é fácil, apesar de pensar nela todos os dias.
“É muito fácil pensar nela, mas é muito difícil falar sobre ela. Porque ela era uma mulher multifacetada. O que eu posso garantir é que ela era sempre a pessoa certa, no momento certo. Uma mãe presente, uma filha presente. Amiga. Tudo sempre fluía muito bem estando ao lado dela. Como pessoa, não tem como descrever a mulher incrível e única que ela foi”, resumiu.
“Eu sinto como se tivessem arrancado a metade do coração, a vida parou sem ela. O sentimento é de que ela era tudo pra mim”.
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Rosemary Costa Pinto, diretora da FVS, é diagnosticada com Covid — Foto: Divulgação
A filha mais nova de Rosemary, a engenheira Camila Costa Pinto, de 33 anos, disse que a mãe era uma pessoa muito amorosa e sempre disposta a ensinar. A última lembrança que tem é de que em um dia ela estava ansiosa, planejando a vacinação para os amazonenses, e dias depois, não estava mais.
“Fica um vazio. A vida sem ela é só saudades. Mas tem uma angústia em particular, sabe? Que nunca mais vou poder perguntar nada dela. Que todo o conhecimento dela foi perdido. E que não poderemos mais compartilhar com ela nossas vitórias nem chorar juntas nossas derrotas”, lamenta.
“Ela defendia com paixão o que acreditava. Tudo o que fazia era com muita dedicação e compromisso. Sempre foi, de coração, uma ótima professora. Ela adorava ensinar, e seu maior legado para nós sempre foi aquilo que nos ensinou”, disse.
Uma das coisas que Camila aprendeu com a mãe, foi a entender a dor do outro. Ela sabe que assim como Rosemary se foi e deixou um legado único, cada vida perdida na luta contra o coronavírus, também deve ser igualmente lembrada e sentida.
“Sabemos que a nossa perda é apenas mais uma entre as muitas famílias que estão perdendo seus amores. A perda é irreparável. Ela é insubstituível, assim como cada vida perdida: cada um que se foi é o amor de alguém”.
Legado
A filha mais velha de Rosemary, Mônica Costa Pinto, de 36 anos disse que sempre vai lembrar da mãe como uma pessoa que sempre conciliou, na medida certa, família e carreira. Com ela, aprendeu muito sobre ciência, mas também aprendeu muito sobre como amar as pessoas.
“Vocês conhecem uma Rose muito séria, muito técnica. Em casa e entre os amigos ela sempre foi chamada de Mary. Era uma mãe, avó, esposa e filha muito carinhosa. Apesar de trabalhar muito sempre manteve o costume de tomar café da manhã com o marido e com o pai, que tem 86 anos. Ao fim do dia, por mais pesado e cansativo que tivesse sido, ela sempre brincava com a neta, lia pra ela, conversava com os filhos”, disse.
O legado que a mãe deixou não só para ela, mas para todos que já ouviram falar de Rosemary, é o do conhecimento, e de como é fundamental ter fé, mas também acreditar nos caminhos da ciência.
“Minha mãe sempre nos ensinou critérios científicos. Ela sempre se pautou por um olhar científico para a realidade. Nós, desde muito jovens aprendemos a só confiar em informações cientificamente válidas, aprendemos desde muito novas o valor do método científico, de identificar um trabalho científico validado adequadamente, a não confiar em achismos”, contou.
Farmacêutica bioquímica, epidemiologista de carreira da FVS e atuava há 25 anos na área. Em nota, no dia de seu falecimento, o governo afirmou que ela sempre “foi uma das bússolas do Amazonas na interpretação dos dados da pandemia no Estado”.
Ainda segundo a FVS, Rosemary Costa Pinto foi uma das idealizadoras da instituição, junto de um grupo técnico composto por sanitaristas, epidemiologistas e infectologistas. O órgão foi instituído por lei em 2004 e iniciou as atividades em 2005. Rosemary foi a única mulher a presidir a instituição.
O órgão informou, ainda, que desde o falecimento de Rosemary, a Fundação é liderada pelo diretor-presidente da FVS, Cristiano Fernandes. Ele já atuava no órgão como diretor-técnico e estava à frente das ações da fundação, juntamente com a então diretora-presidente.